Andréa Arruda Vaz[1]
Claudinei Gomes Daniel[2]
INTRODUÇÃO
Este breve artigo apresenta de forma bastante simples o conteúdo da emenda de comissão nº. 323 apresentada e aprovada pelo plenário da Câmara dos deputados no último dia 17 de junho de 2020. Tal proposta basicamente propõe a inclusão do parágrafo único ao artigo 30 da MP 927/2020, para determinar que durante o período de suspensão total ou parcial das atividades econômicas, as empresas terão a suspensão automática de todos os acordos trabalhistas em andamento, sejam eles judiciais ou extrajudiciais.
1. A PROPOSTA DE EMENDA DE COMISSÃO Nº. 323: CONTEÚDO E ANDAMENTO E AS MEDIDAS DE ENFRENTAMENTO DA PANDEMIA
O Brasil, após o dia 26 de fevereiro de 2020, reconheceu a existência de pandemia de COVID-19. A pandemia afetou a vida e a saúde dos brasileiros, assim como na maioria dos países do planeta. O Brasil estava em período de recuperação, ainda da crise econômica de 2014, porém em 30 de março de 2020 aconteceu o primeiro registro de retração do PIB para o ano.
Ao longo dos últimos 90 dias, inúmeras medidas tanto pelo Governo Federal, assim como pelos governos estaduais e municipais impuseram medidas para contenção da disseminação do vírus, assim como medidas para redução dos impactos na economia. É inegável que a crise econômica atingiu a maioria dos setores da economia, inclusive serviços essenciais, o que legou o Congresso a aprovar o auxílio emergencial.
O país fora afetado em todos os seus setores, saúde, educação, cultura e até mesmo os templos religiosos foram amplamente afetados em função do isolamento social imposto, das medidas impositivas de redução da circulação em função da pandemia.
A decretação do estado de pandemia e do reconhecimento nacional da calamidade na saúde pública impôs aos brasileiros uma mudança de hábitos, como por exemplo, compras online em larga escala, trabalho em sistema de home office, reuniões virtuais, no âmbito público e privado, além de toda a mudança brusca na educação, que da noite para o dia autorizou que as instituições de ensino funcionem com aulas por métodos virtuais. Ainda, foram aprovadas medidas para contenção do vírus, medidas legislativas para socorro a população, assim como medidas para contenção da catástrofe econômica, assim como medidas trabalhistas de enfrentamento da calamidade. Um desses instrumentos é a Medida Provisória nº. 927 publicada no dia 22 de março de 2020.
2. OS IMPACTOS DA APROVAÇÃO DA EMENDA DE COMISSÃO Nº. 323 PARA O TRABALHADOR
A medida provisória nº. 927/2020 dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19), e dá outras providências, conforme consta do seu próprio texto.
Esta Medida Provisória trata da adoção do sistema de teletrabalho, da possibilidade de antecipação de férias individuais, concessão de férias coletivas, aproveitamento e antecipação de feriados, flexibilização de banco de horas, entre outras medidas trabalhistas. Tais com objetivo de reduzir o risco de desemprego, assegurar renda e de um modo geral segurar a demissão em massa decorrente das restrições impostas ao desenvolvimento da atividade econômica em função da pandemia.
O artigo 30 da MP nº. 927 diz que “Os acordos e as convenções coletivos vencidos ou vincendos, no prazo de cento e oitenta dias, contado da data de entrada em vigor desta Medida Provisória, poderão ser prorrogados, a critério do empregador, pelo prazo de noventa dias, após o termo final deste prazo.”
No dia 23 de março de 2020, a deputada Soraya Santos, do PL/RJ apresentou a emenda de comissão nº. 323, que foi colocada em votação em plenário no último dia 17 de junho de 2020, cuja aprovação aconteceu por 315 votos positivos contra 135 votos pela rejeição da mesma.
Importante esclarecer que emendas de comissão são normalmente apresentadas de acordo com a temática para cada comissão na câmara dos deputados e foi assim que procedeu a deputada Soraya, requerendo por meio da emenda nº 323, a inclusão do parágrafo único ao artigo 30 da MP 927. A emenda proposta assim versa:
Parágrafo único. Quando houver paralisação total ou parcial das atividades da empresa por determinação do Poder Público, fica suspenso, a partir da publicação desta Medida Provisória, pelo período do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, o cumprimento dos acordos trabalhistas em andamento, bem como o protesto de títulos executivos:
I – celebrados na rescisão do contrato de trabalho ou nos acordos judiciais nas reclamações trabalhistas;
II – que disponham sobre planos de demissão voluntária nos termos do art. 477-B da Consolidação das Leis do Trabalho”.
Tal proposta, ante a aprovação em plenário no dia 17 de junho de 2020, foi remetida ao senado já no dia 18 de junho de 2020, para colocação em pauta também.
A proposta de suspensão dos acordos trabalhistas em andamento, não só viola princípios básicos e elementares, como a dignidade humana e boa-fé estatal, assim como desrespeita integralmente o princípio de observação a hipossuficiência do empregado. O Congresso Nacional tem que compreender que o trabalhador é um ser humano e que este já está em uma situação de extrema e endêmica desvantagem com relação ao empregador.
Ademais, na maioria das vezes o empregado buscou o poder judiciário trabalhista para reaver direitos e garantias fundamentais, previstas no artigo 7º da Constituição de 1988, tais como saldo de salário e verbas rescisórias em si. A grande maioria das demandas trabalhistas versa a respeito do inadimplemento de verbas rescisórias e horas extraordinárias. Ainda, outro desarranjo social é para com a advocacia trabalhista, que tem a sua renda firmada, na maioria das vezes em honorários decorrentes de parcelas de acordo trabalhista. Tal categoria, da mesma forma será amplamente afetada.
CONCLUSÃO:
A aprovação da emenda de comissão nº. 323/2020 é uma afronta aos princípios mais basilares do direito do trabalho, qual seja, a proteção ao empregado, ao respeito a hipossuficiência do empregado, assim como violação direta a princípios e garantias fundamentais constitucionais. Ademais, há que se lembrar que a suspensão dos acordos em andamento vulnerabiliza ainda mais o empregado, aquele que pode estar sem renda e desempregado.
Ademais, por vezes é a única renda que esse empregado possui durante o período de isolamento social e mais, de completo assolamento das vagas de trabalho no país. Há que se atentar também para a classe da advocacia, que na maioria das vezes é autônoma e que também automaticamente deixará de receber seus honorários, que também são verbas alimentares.
Bibliografia:
Congresso nacional. Proposta de emenda de comissão 323/2020.
Planalto. MP 927/2020.
[1] Doutoranda em Direito Constitucional pelo Centro Universitário do Brasil - UniBrasil e Mestre em Direito pelo Centro Universitário do Brasil - UniBrasil, turma 2013. Pós-graduação em Direito Público, com ênfase em Direito Administrativo pela Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro em 2009, Pós-graduação em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes, Rio de Janeiro em 2010. Especialista em Direito e Processo do Trabalho pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná em 2012. Especialista em educação e metodologias de ensino pela Facear Araucária em 2015. Graduada em Direito pela Faculdade Dom Bosco em 2008. Diretora da Comissão de Direito do Trabalho da OAB/PR - subseção Araucária - gestão 2016-2018; Professora convidada na pós-graduação, nos cursos de Gestão Administrativa e financeira e Gestão de Recursos Humanos no Centro Universitário UNINTER. Professora convidada na pós-graduação em Direitos Humanos na PUC/PR. Professora no curso de Direito, na disciplina de História do Direito e Direito Constitucional no centro universitário UniFaesp. Advogada atuante nas áreas de direito e processo do trabalho, direito coletivo do trabalho, Direito Civil e Direito Administrativo, Direito Constitucional e direito penal. Autora de diversos artigos (em revistas nacionais e internacionais), capítulos de livros e do livro: Direito Fundamental a Liberdade sindical no Brasil e os Tratados de Direitos Humanos. Pesquisadora nas Áreas de Direitos Fundamentais, Direito Internacional do Trabalho, Direito Constitucional e Direitos Humanos. Conselheira da OAB/Pr, Subseção Araucária - Gestão 2019-2021. Diretora da Comissão de Educação Jurídica na OAB/Pr, Subseção Araucária - gestão 2019-2021, Diretora da ESA na OAB/Pr, Subseção Araucária - gestão 2019-2021. [2] Acadêmico de Direito do 3º Período pela Faculdade Anchieta de Ensino Superior do Paraná – FAESP (Centro Universitário UNIFAESP). Formação Técnica em Contabilidade pelo CEMUS - Centro Municipal da Cidade de Salto, Estado de São Paulo. Secretário da Presidência do Sindicato dos Advogados do Estado do Paraná, desde o ano de 2017.